O mais antigo programa para um sistema do Idealismo alemão

Manuscrito anônimo encontrado nos cadernos de Georg Wilhelm Friedrich Hegel, redigido com a provável colaboração de Friedrich Schelling e Friedrich Hölderlin. Tubinga, c. 1796 d.C.

 

Uma Ética. Dado que toda metafísica cairá doravante numa moral – algo de que Kant, com ambos os seus postulados práticos, deu somente um exemplo sem exaurir nada –, tal ética conterá nada mais que um sistema completo de todas as ideias, ou, o que dá no mesmo, de todos os postulados práticos. A primeira ideia é naturalmente a concepção de mim mesmo como um ser absolutamente livre. Junto ao ser livre e autoconsciente todo um mundo emerge simultaneamente – do nada – a única criação do nada verdadeira e concebível. Aqui descemos aos campos da física; a questão é esta: Como um mundo deveria ser constituído para um ser moral? Eu gostaria de lhes oferecer nossa física, progredindo laboriosamente com experimentos, voando de novo.

Assim, sempre que a filosofia provê as ideias, experimenta os dados, podemos finalmente obter uma física do todo, coisa que espero para as próximas épocas. A física do tempo presente não parece ser capaz de satisfazer um espírito criativo como o nosso é ou deveria ser.

Da natureza eu passo às obras do homem. A ideia da raça humana em primeiro lugar – pretendo mostrar que não há ideia do Estado porque o Estado é algo mecânico, assim como não há a ideia de uma máquina.

Somente aquilo que é objeto da liberdade é chamado ideia. Devemos portanto ir além do Estado! – Porque todo estado deve tratar seres humanos livres como coisas mecânicas; e não deveria fazê-lo; portanto ele deveria acabar. Você pode ver por si mesmo que aqui todas as ideias, a de uma paz eterna etc., são somente ideias subordinadas a uma ideia superior. Ao mesmo tempo quero estabelecer aqui os princípios para uma história da raça humana e expor todo o miserável trabalho humano em questões de Estado, constituição, governo, legislação – até a pele. Finalmente as ideias de um mundo moral, da deidade e da imortalidade – subverter tudo (superstição) pseudo-doutrinas, perseguição do clero, que recentemente suscitada como razão, surge de si mesma. – Liberdade absoluta de todos os espíritos que trazem o mundo intelectual em si mesmos, e que não buscarão nem Deus nem a imortalidade fora de si mesmos.

Finalmente a ideia que une tudo, a ideia de Beleza, na acepção mais altamente platônica da palavra. Estou convencido de que o ato mais alto da razão, compreendendo todas as ideias, é um ato estético, e também de que a verdade e a bondade se unem como irmãs somente na beleza. – O filósofo deve possuir tanto poder estético quanto o poeta. As pessoas sem senso estético são nossos filósofos da letra. A filosofia do espírito é uma filosofia estética. Não se pode ser sabido em todas as coisas, não se pode sequer raciocinar sabidamente sobre a história, sem senso estético. É o momento de revelar aqui o que essas pessoas que não entendem as ideias não possuem – e com muita singeleza admitem que tudo é obscuro para elas tão logo se vai além de gráficos e estatísticas.

A poesia portanto obtém uma dignidade superior; se torna novamente no fim o que era no início – educadora da (história) da raça humana porque já não há nenhuma filosofia, nenhuma história; a arte poética sozinha sobrevive além de todas as ciências e artes.

Ao mesmo tempo, ouvimos com frequência que a grande multidão deveria ter uma religião sensual. Não somente a grande multidão, mas a própria filosofia precisa disso. Monoteísmo da razão e do coração, politeísmo da imaginação e da arte, é disso que precisamos!

Primeiro falarei de uma ideia aqui, que, até onde sei, jamais ocorreu à mente de ninguém – devemos ter uma nova mitologia; esta mitologia deve, entretanto, se erguer à serviço das ideias, deve se tornar uma mitologia da razão.

Até que façamos ideias estéticas, isto é, mitológicas, elas não terão interesse para o povo, e, correspondentemente, enquanto a mitologia não for razoável, o filósofo deve sentir vergonha dela. Assim, finalmente, o esclarecido e o obtuso devem se dar as mãos; a mitologia deve se tornar filosófica, e o povo razoável, e a filosofia deve se tornar mitológica a fim de fazer com que a filosofia seja sensual. Então a unidade externa reinará entre nós. Nunca mais o olhar de desprezo, nunca mais o tremor cego do povo ante seus sábios e sacerdotes. Somente assim o desenvolvimento igual de todos os poderes nos espera, do indivíduo assim como de todos os indivíduos. Nenhum poder voltará a ser suprimido, então a liberdade geral e a igualdade dos espíritos reinará. – Um espírito mais alto enviado do céu deve estabelecer esta religião entre nós, será o último trabalho da raça humana.